Por mais que os processos industriais se automatizem, a presença humana não deixa de ser relevante. É do homem que vêm a percepção, as idéias e as melhorias, que vão ser executadas por ele ou pelas máquinas. Se durante muito tempo a fidelidade e a dedicação de um funcionário à empresa eram baseadas na imposição e na verticalidade, hoje elas surgem como resultados de incentivos e, muitas vezes, na forma de pequenas mudanças. Um ajuste aqui e outro acolá podem apontar para a conformação de uma nova realidade dentro da companhia, realidade essa de alta complexidade e grande dinamismo.

Um exemplo de mudanças a partir de pequenos processos está na Abril Gráfica, divisão do Grupo Abril, responsável pela impressão e acabamento do produtos da editora e de outras empresas do setor. De um tradicional ambiente de impressão, há até dez anos, a empresa vem implantando pequenas alterações, detalhes mínimos, quase imperceptíveis, em cada posto de trabalho. Só neste ano foram mais de 500. Os autores foram os próprios funcionários, afinal, quem mais conhece a sua realidade do que quem a vive, todos os dias? O resultado, pelo menos até o momento, é intangível, mas já ultrapassou as paredes da área operacional e começa a ser implantado, inclusive, pelo setor administrativo.

A individualidade das mudanças não quer dizer que a empresa tenha perdido a identidade ou deixado de lado sua gestão por processos. A personalização das atividades foi prevista e acompanhada e corresponde aos princípios da governança corporativa do grupo. O modelo preza pela participação ativa dos funcionários: desde a identificação dos problemas, passando pela análise de soluções até a implantação das ações de melhorias.

“Uma vez que a abordagem proposta viabilize as mudanças, a implementação das melhorias flui naturalmente pela organização” é o que contou Thiago Santos, analista de qualidade da gráfica. “Isso só é possível”, continua, “porque todo o quadro de funcionários está engajado no projeto. Eles foram elementos essenciais na concepção dos planos de melhorias”.

Participação individual é a chave

Aumentar o nível de comprometimento dos funcionários com o seu local e equipamento de trabalho é o principal objetivo deste programa. “Queremos fazer com que cresça a sensação de propriedade das pessoas sobre seu ambiente, sobre sua máquina. Quando ele se sente dono do seu local de trabalho, seu nível de comprometimento aumenta muito”, explicou Santos.

Como conseqüência, foi notada uma expressiva melhoria na qualidade e nas condições de trabalho, além do aumento de produtividade e a redução nos gastos. Os dois últimos, apesar de perceptíveis, ainda não foram medidos. 

Se o operador de uma máquina percebe que uma peça muito cara quebra constantemente,  ele sugere a sua substituição, por exemplo. “Ao propor a troca de um sensor importado por um nacional, a nossa despesa será reduzida”, explicou o analista. Santos salientou casos de trabalhadores que sabem detectar problemas, mas não sabem solucioná-los.

“Esse não pode ser um motivo para que o problema não seja apontado, ele [o funcionário] tem que correr atrás de alguém que possa solucionar a questão. O operador deve  procurar um manutencista, explicar o que está acontecendo para, juntos, resolverem o problema. Além da solução em si, essa situação aproxima as pessoas”, afirmou o técnico.

Melhoria implantada, premiação garantida

Para que esses detalhes não se percam diante da complexidade produtiva  –  o que pode vir a diminuir o entusiasmo do empregado em colaborar  –  integrantes da alta gerência da gráfica fazem visitas mensais a todas as melhorias implantadas no período. É nessa hora que cada uma é apresentada por quem a idealizou e implantou.  Os funcionários são, então, reconhecidos e incentivados pelos gerentes a gerar novas idéias. As mudanças implantadas são documentadas e seus executantes ganham pontos, que podem ser trocados por  brindes.

“Queremos que eles se sintam donos e responsáveis pelo seu local de trabalho. Não importa se a melhoria vai gerar economia de R$100 ou de R$ 1 mil, mas que tenham isso como princípio profissional e não como uma meta monetária. Por isso optamos por não dar premiações de alto valor, mas investir no reconhecimento, mostrar que conhecemos cada um individualmente e que estamos apreciando o que eles estão fazendo”, informou Santos.

A sistematização do processo prevê critérios para pontuação e premiação: a melhoria tem de ser implantada e cadastrada, além de ser executada pelo grupo idealizador, no prazo máximo de 30 dias. É necessário, ainda, apresentar o demonstrativo de ganho. As inovações não precisam estar diretamente ligadas à atividade produtiva: também são levados em conta ganhos indiretos, como alterações na luminosidade, ventilação, sinalização e segurança.

“A identificação de riscos traz ganhos enormes para o indivíduo e para a empresa. Para minimizá-los são geradas melhorias, como a colocação de uma proteção ou a remoção de parte de uma máquina”, disse o analista.

Meta para 2007

O sucesso do programa na área operacional chamou a atenção do setor administrativo. O processo, por exemplo, levou a alterações de planilhas utilizadas pelo escritório. “No ano de 2006 tivemos 309 melhorias implantadas. Em 2007, até o final de agosto, foram implantadas 573. Queremos chegar a mil até o final do ano. Esse crescimento mostra que o profissional ficou mais crítico, observador e questionador”, disse Santos.

Para atingir esse objetivo, a Abril aposta em três pilares: o envolvimento individual de cada funcionário, o empenho da gerência no processo de reconhecimento da iniciativa dos trabalhadores e a capacitação. Para o próximo ano, a empresa terá, como parte do processo de melhorias, a aplicação de um treinamento de como identificar oportunidades de inovação e concretizá-las.