Responsabilidade Social como expressão de cidadania

O cenário problemático do desenvolvimento social, político e econômico –seja no Brasil, seja em países de economia avançada –não será superado com medidas simples, cuja responsabilidade é atribuída a um ou outro ator social.

Há mais de uma década, o predomínio de políticas econômicas neoliberais vem contabilizando um quadro paradoxal de avanços e mazelas sociais. Se a complexidade deste cenário, por um lado, tornou insuportavelmente agudos os problemas da exclusão social, por outro lado, propiciou a convergência de opiniões sobre a necessidade de integrar os mais diversos atores sociais no esforço de promover o desenvolvimento. 

Nos anos 80 e 90, o professor Bernardo Kliksberg já denunciava a progressiva pobreza dos países da América Latina, denotada pela exclusão de amplos segmentos da população, não apenas do mercado, mas também da participação social e política. Nos primórdios dos anos 90, Henrique Rattner completava este raciocínio, postulando que o desenvolvimento sustentável deveria abranger as dimensões sociais, econômicas e ambientais, assegurando a precedência do bem comum sobre os interesses particulares. Tais proposições deságuam no século XXI, com a constatação da ‘liberdade como desenvolvimento’ por Amartya Sen.


Coloca-se, portanto, o desafio da colaboração entre os mais diversos atores sociais, provocando a revisão de alguns conceitos fundamentais. A função social da empresa na economia capitalista, que alimenta polêmicas desde a Revolução Industrial, torna-se uma prática de estratégia e gestão bastante ampliada. Já não se traduz apenas por: produzir riqueza, multiplicar o capital investido, gerar empregos e arrecadar tributos. Os compromissos com o desenvolvimento das pessoas que emprega; com a segurança e a satisfação dos clientes e consumidores; com a proteção do ambiente e preservação dos recursos não renováveis e; com o bem-estar da comunidade despontam como alvos estratégicos, tão importantes quanto sempre foram marketshare e rentabilidade do negócio para a lógica do empreendedorismo capitalista. 

No mesmo sentido, já não se espera que uma entidade beneficente se ocupe apenas de atender as necessidades básicas de seus ‘assistidos’. Mas que gere resultados efetivos de transformação; que promova a emancipação das pessoas que atende, ao orientá-las no sentido de eliminar ou reduzir sua condição de exclusão; que contribua para modificar o quadro de desigualdade e injustiça social. 
Essas mudanças que vêm ocorrendo nas organizações do setor privado e do Terceiro Setor geram impacto também sobre os órgãos da administração pública. Desde a formulação da Carta Constitucional de 1988, as formas participativas de gestão – o orçamento participativo, os conselhos municipais, entre outros – vêm alterando o modo de conceber e implementar políticas públicas. As alianças intersetoriais como forma de articulação institucional e de agregação organizacional, despontam como uma configuração adequada e eficiente para viabilizar o esforço coletivo de atores sociais diversos, embora convergentes em seus ideais. As alianças organizacionais criadas para implantar e gerir ações sociais estão fundamentadas no conceito da colaboração entre organizações de diferentes setores – um conceito integrador que se coloca acima das vertentes político-ideológicas e dos interesses específicos de cada setor e de cada organização. 

Para concretizar a idéia de colaboração entre as organizações da sociedade civil e o mundo dos negócios em um contexto econômico capitalista, é preciso esclarecer algumas premissas. A primeira e mais profunda assume que a sociedade que desejamos está fundeada no conceito de democracia como valor universal. A segunda estabelece que os direitos de cidadania são essenciais para assegurar a existência e a plenitude dessa sociedade democrática. Vale dizer que os cidadãos – pessoas ou grupos – são aqueles que exercem efetivamente a responsabilidade pela manutenção da tessitura social. Nós cidadãos, isto é, cada um e todos aqueles que desfrutam dos direitos formais ou tácitos, que dão consistência à estrutura social em que vivemos, também são os que assumem o dever de garantir a sobrevivência dessa sociedade.


Essa breve reflexão acerca do tema da Responsabilidade Social não tem o objetivo de amplificar a complexidade do assunto, mas de alertar o leitor acerca da tendência reducionista de simplificar seu significado e tornar superficiais suas práticas culturais profundas, no que tange aos valores de responsabilidade das pessoas e das organizações envolvidas. 

Está constatado que o cenário problemático do desenvolvimento social, político e econômico – seja no Brasil, seja em países de economia avançada – não será superado com medidas simples, cuja responsabilidade é atribuída a um ou outro ator social. Essa responsabilidade deve ser necessariamente compartilhada entre diversos atores – pessoas e organizações – que integrem esforços, recursos e competências. Portanto, o maior desafio que se coloca à colaboração intersetorial para o desenvolvimento é o da consolidação de valores e padrões culturais que sustentem a responsabilidade social como atributo de qualquer cidadão.

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